sexta-feira, 30 de setembro de 2022

"Rumores de que o Bispo Ximenes Belo era pedófilo eram sussurrados por alguns, poucos, timorenses mais arrojados"


O Regiões - Crónica de Manuela Teixeira

Caiu o segredo mais bem guardada de Timor Leste. Há 22 anos, quando estive pela primeira vez em Timor, os rumores de que o Bispo Ximenes Belo era pedófilo eram sussurrados por alguns, poucos, timorenses mais arrojados. Em surdina, sem provas, sem rostos, sem nomes. Era um segredo proibido. Muito proibido. 

D. Ximenes Belo era não só um líder religioso, também um líder político, um líder da independência e Prémio Nobel da Paz em 1996. Era ainda um homem temido pelo católico povo timorense. Diziam alguns, entre risadinhas, que “ele gostava de meninos”. Nunca ouvi a palavra ‘pedófilo’, porque poucos a conheciam. 

Mas quando se tentava saber mais, calavam-se e nunca mais tocavam no assunto. Nós, alguns dos jornalistas portugueses, ainda perseguimos o rumor até esbarrar-mos sempre com um silêncio ameaçador. Nenhum outro líder timorense se atreveu a falar do assunto. E quem falava, desmentiria, caso a notícia fosse avançada. 

Com a presença constante dos jornalistas portugueses em Timor, o bispo Belo começou a ficar nervoso e irritado. Tentou várias vezes calar a comunicação social, quando se noticiava algumas das atitudes dele.

Já em 2002, a dada altura, nas missas, atacou as ONGs que trabalhavam com o planeamento familiar, e a imprensa questionou-o. Ele irritou-se demasiado e depois de negar acabou a defender o “coito interrompido”. Acusava os estrangeiros de levarem para Timor “a pouca-vergonha, a indecência, as modas nada católicas”. 

Ganhou um odiozinho de estimação ao jornalista-correspondente da Lusa, António Sampaio, que publicava as azias do bispo Belo, chegando mesmo a lançar ameaças que até Ramos Horta levou a sério, tendo tomado medidas de proteção á casa da Lusa, onde vivia a família Sampaio. 

Estávamos perto da Independência, quando o bispo começou a revelar medo dos jornalistas que estavam em Dili há muito tempo. 

Depois de 20 de maio de 2002, dia em que nasceu o país Timor Leste, Ximenes Belo não demorou muito tempo a deixar a ilha. Andou muito por aqui, por Portugal, mas pouco apareceu em público. Refugiou-se nos Salesianos, em Lisboa e agora, que o escândalo das suas práticas pedófilas veio a público, desapareceu. Ninguém sabe onde está o bispo Ximenes Belo. 

Em Timor, o silêncio continua. O presidente Ramos Horta, que se saiba, nada disse. E nem o desbotado líder histórico Xanana Gusmão abre a boca. 

Como se ainda vivessem nas montanhas nos tempos da resistência, os líderes protegem-se ainda uns aos outros. 

Também o Vaticano conseguiu guardar o segredo até estes dias de finais de setembro de 2022. 

Agora o segredo caiu e tenho a certeza que o povo timorense está aliviado deste pesadelo. E eu só lamento não ter conseguido provas para contar esta história quando estive em Timor, há mais de 20 anos.

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