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Diário de Notícias - 06 de novembro de 2014
Investigações de magistrados portugueses indiciavam ajustes diretos para
obras públicas que terão beneficiado empresas de familiares de
ministros.
As investigações desenvolvidas
pelos sete magistrados portugueses expulsos de Díli revelaram que pelo
menos oito ministros timorenses estariam a favorecer empresas de
familiares seus em ajustes diretos para obras públicas. Este é mais um
pormenor do emaranhado caso que começou a ser desenterrado há cerca de
três anos pelos funcionários portugueses, segundo soube o DN junto de
fontes conhecedoras do processo político.
As mesmas identificam a situação como uma enorme teia de ligações de onde se extraíram suspeitas, ao mais alto nível, de crimes como corrupção, abuso de poder, participação económica em negócio e peculato (apropriação indevida de fundos e bens públicos).
Aliás, terá sido por causa das investigações tuteladas por magistrados portugueses que duas "cabeças" rolaram na hierarquia liderada por Xanana: Lúcia Lobato, ex-ministra da Justiça timorense condenada, em 2013, a cinco anos de prisão pela prática de um crime de participação económica em negócio; e Emília Pires, ministra das Finanças acusada de gestão danosa e participação económica em negócio, que ia começar a ser julgada na passada segunda-feira.
Mas o julgamento foi adiado sine die, precisamente no dia em que Xanana Gusmão mandou publicar a ordem de expulsão dos sete magistrados portugueses e de um procurador cabo-verdiano (com dupla nacionalidade).
No entanto, o primeiro-ministro timorense alegou ontem outros motivos para as expulsões, nomeadamente de “interesse nacional”. O DN soube que pelo menos três dos cinco juizes portugueses expulsos na segunda-feira e uma procuradora já estão de regresso a Portugal, estando a chegada de alguns prevista para amanhã. Simplesmente, nem todos conseguiram voo para o mesmo dia, e tal terá dificultado o cumprimento do prazo de expulsão de 48 horas dado pelo governo de Xanana Gusmão.
Além dos cinco abrangidos pela resolução, o Conselho Superior da Magistratura (CSM) ordenou também na terça-feira o regresso de outros dois juizes que estavam apenas com funções de formação, Alexandre Baptista Coelho e Fernando Estrela. “Mas estes ainda nem foram oficialmente notificados da deliberação do CSM, apenas informados.
O seu regresso não tem a mesma urgência dos outros a quem foi decretada a expulsão”, explicou a porta-voz do CSM, Albertina Pedroso. “Alguns dos magistrados só poderão embarcar na quinta-feira”, referiu ao DN Rui Cardoso, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP). O dirigente sindical adiantou que, do lado do Ministério Público (MP), apenas a procuradora Glória Alves, que estava no gabinete anticorrupção do MP em Díli, foi abrangida pela ordem de expulsão do executivo timorense. Restam em Díli os procuradores João Luís Gonçalves, assessor jurídico no Ministério da Justiça timorense, e João Alves, que está na área do direito cível. Nenhum deles está incluído no despacho de Xanana, mas o Conselho Superior do Ministério Público defendeu o “rápido regresso” de todos os procuradores que estejam em Timor.
João Luís Gonçalves já declarou ao Diário de Notícias da Madeira não estar abrangido pela resolução do executivo timorense por esta “não abranger os assessores dos ministérios”.
Ministra suspende cooperação
Perante este cenário de tensão diplomática, a ministra da Justiça portuguesa já anunciou que a cooperação judiciária com Timor-Leste encontra-se suspensa. Paula Teixeira da Cruz afirmou ontem, em comunicado, não estarem criadas condições adequadas para a política de cooperação na área jurídica com aquele país, depois de ter sido decretada a expulsão de juizes daquele território.
“A ministra da Justiça entende não estarem criadas as condições adequadas para prosseguir a política de cooperação na área judiciária sem que primeiro tenha lugar uma reavaliação cuidada de pressupostos e regras bem diversas das que conduziram à atual situação”, afirmou Paula Teixeira da Cruz, em comunicado. Entretanto, o ministro da Justiça de Timor-Leste, Dionísio Babo, “foi incumbido pelo seu governo para ir a Portugal e explicar, em pormenor, a decisão do Parlamento nacional, assim como a decisão do Conselho de Ministros”, referiu à Lusa o chefe da diplomacia timorense, José Luís Guterres.
O ministro dos Negócios Estrangeiros de Timor-Leste acrescentou ainda que respeita a decisão do Conselho Superior de Magistratura de Portugal, de ordenar o regresso não só dos cinco juízes expulsos por Díli mas de todos os magistrados judiciais que ainda lá se encontram (sete, no total). “Respeitamos a decisão do Conselho Superior de Magistratura e, da nossa parte, continuaremos a fazer esforços para que a cooperação no setor da Justiça continue com Portugal e outros países da CPLP, de modo a permitir que os nossos juízes ganhem, o mais rapidamente possível, a experiência necessária”, disse José Luís Guterres.
No dia 24 de outubro, o Parlamento timorense aprovou uma resolução para suspender os contratos com funcionários judiciais internacionais ” invocando motivos de força maior e a necessidade de proteger de forma intransigente o interesse nacional”. Díli está agora a tentar atenuar o ambiente beligerante que se criou nos canais diplomáticos. “Não houve nem haverá intenção de acabar com a cooperação portuguesa”, sublinhou o ministro José Luís Guterres.
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